sexta-feira, março 17, 2006

Manifesto Arquitectura: da Literatura

Nasceu faz muitas páginas, dançou na valsa, no bolero, na morna, na bossa nova, canta fados; não consta que tenha morrido. Agarrou-se com as unhas no mar, nas pedras, à morte e ao amor, à vida e ao escuro. Surripiou a voz às gentes e deu-lhe subtileza.
Pousou como pássaro nas mais altas árvores que o mundo viu nascer. Sorriu as deliciosas flores, rebeldes!, do campo ameno, de brisas suaves, de casa só, de pés descalços. Voltou-se ao vinho. Embebedou-se como ninguém. Foi subversiva e arrivista. Faltou jantares. Assobiou músicas proibidas de vermelho ou azul. Pintou murais vastos de fome.
Intelectualizou-se. Como dos grandes narizes que cheiram rabos mal limpos, empestados de um perfume muito caro que adivinha muitos, muitos chapéus. Chorou muito. E pôs-se mesmo a morrer. Mas foi viajar. E de entre todos os mundos, escolheu o dilúculo com mãos de sal. Por morada.
À poesia e ao seu dia no mundo prestamos uma homenagem ao piano. Com braços curtos. De vontades longas. Das mais largas florestas com muita chuva e animais e árvores muito, muito verdes e castanhas, e o açúcar, e sons, muitos sons, vindos daqui e dali e por cima, que reviram a terra húmida dos fungos. Dos rios com peixes dentro. Dos que nadam! Numa vontade natural, num acto puro de paixão. Na entrega desmesurada. Arrumando relógios no esquecimento. Com as palavras que escorrem pelas mãos. Que nos aprisionam, que nos cativam. Responsáveis para sempre. Pelo que nos plantaram.